Fintechs: emissão de FIDCs para crédito deve alcançar R$ 14 bi no ano

Emissão de fundos de direito creditórios deve dobrar em 2021 e seguir em expansão nos próximos anos mesmo com juro mais alto

As fintechs brasileiras devem conceder um volume recorde de crédito em 2021 por meio de Fundos de Investimentos em Direitos Creditórios (FIDCs). O movimento já era esperado, como tendência, mas a velocidade tem superado as expectativas. A estimativa de especialistas é que ano termine com um volume de R$ 14 bilhões em FIDCs estruturados por fintechs, o dobro do ano passado.

Até julho, essa soma estava em R$ 8 bilhões, de acordo com levantamento realizado pela Uqbar, em pesquisa encomendada pelo banco BV. A instituição é bastante ativa nesse mercado e absorveu cerca de 25% desse volume. Em sete meses, a soma já superava todo o ano de 2020, quando foram emitidos R$ 6,9 bilhões em carteiras desse tipo. Em 2019, essas emissões totalizaram R$ 4,9 bilhões.

Muitas vezes, um FIDC tem um impacto no crédito superior ao montante total da carteira, pois o fundo pode ter uma vida longa comparado aos prazos dos créditos concedidos. Ou seja, o mesmo dinheiro é reinvestido depois.

Yuri Ramos, superintendente de corporate e investment banking do BV, acredita que o volume total pode alcançar até R$ 16 bilhões e que em 2022 haverá crescimento forte do volume entre 30% e 40%, pelo menos. “O que a gente vê aqui em produção justifica essa expectativa. A fila para emissões está muito grande.”

Para o Brasil, a novidade é excelente. Em sua maioria, segundo Ramos, as fintechs estão atendendo a pessoas que estavam fora do sistema financeiro, que não tinham acesso ao crédito bancário no seu formato mais tradicional. A maioria dos recebíveis dentro dos fundos refere-se a cartões de crédito. Esse é o principal motivo para o executivo acreditar que o crescimento seguirá forte, pois há muito espaço no país. “As fintechs estão crescendo nos espaços vazios. Muita gente subestima o efeito da entrada desses cartões no mercado.”

Mas Ramos vê outros fatores que devem afetar de forma positiva as fintechs e suas concessões de crédito. Na opinião dele são três os principais fatores: o open finance, a mudança de regras pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e a Lei da Liberdade Econômica.

A alteração que está prestes a ser realizada pelo regulador do mercado de fundos vai permitir que as pessoas físicas invistam em FIDCs, o varejo. Até agora, esse é um produto acessível apenas a investidores qualificados, por meio de gestoras de recursos. Significa, portanto, mais dinheiro para essa modalidade. Já o open finance, como é chamada a nova regulamentação do Banco Central por meio da qual as pessoas poderão compartilhar seu histórico bancário para conseguir melhores condições, vai trazer mais segurança às fintechs, que poderão conceder um volume maior de recursos.

Os FIDCs têm se revelado o principal instrumento de funding para as fintechs, ou seja, esses fundos fornecem o dinheiro que essas empresas financeiras digitais usam para conceder crédito.

“Mas eu não tenho a menor dúvida de que a atuação dessas instituições digitais será cada vez mais regulada, considerando o que existe na Europa, Estados Unidos e Ásia”, diz o executivo do BV, ao olhar para mercados mais evoluídos.

Especialistas apontam a expansão do crédito concedido pelas fintechs como direção inequívoca, mesmo em cenário de juros mais altos e, em tese, maior risco de inadimplência. “Está em curso uma mudança estrutural do sistema”, enfatiza Ramos.

A tendência também é que esse segmento se retroalimente. Quanto mais crédito as fintechs concedem, mais dados desse mercado que antes não era atendido elas captam. Mais informação, trabalhada da maneira correta, fornece mais previsibilidade às carteiras na gestão do risco.

Irrigação

Essa expansão também é fruto da força de captação pelos fundos de renda fixa. Os dados da Anbima mostram que a entrada líquida de recursos nesses tipos de carteiras já supera R$ 310 bilhões neste ano, até novembro. Esse volume é recorde e um nunca visto antes nessa proporção.

O total captado até agora mais do que compensa os saques acumulados de R$ 45 bilhões que esses fundos sofreram nos anos de 2018, 2019 e 2020 — período em que os portfólios dedicados a ações e os multimercados foram as estrelas na atração de recursos.

Apesar do forte crescimento, os direitos creditórios ainda representam uma parcela diminuta da aplicação da indústria de fundos. O levantamento da Anbima mostra que, de um patrimônio total de R$ 5,5 trilhões, pouco mais de 1% está alocado nesse tipo de ativo.

A Selic em alta, portanto, não deve fazer esse mercado encolher. Tudo indica que o vento a favor é mais forte, com o forte fluxo de recursos disponíveis para investimento pelo mercado. Fica no ar a pergunta: há justificativa para a forte penalização que o mercado de ações promoveu com as fintechs mundo afora, por causa da taxa de juros?

Fonte: Exame.

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